Crítica | O Esquema Fenício - É uma celebração do excesso de controle, onde tudo é tão perfeito que se torna, paradoxalmente, insuportavelmente artificial.

Divulgação | Universal Pictures
 
• Por Alisson Santos 

O Esquema Fenício é, sem qualquer dúvida, um espetáculo visual. Cada enquadramento parece ter sido cuidadosamente pensado para se transformar em uma obra de arte estática. As paletas de cores são organizadas de forma quase obsessiva, a composição cenográfica é milimetricamente calculada, e os movimentos de câmera seguem um balé rigoroso, onde tudo se move no tempo e no espaço com uma precisão quase antinatural.

Esse cuidado extremo com a estética, que em outros momentos da carreira de seu diretor funcionou como uma assinatura de personalidade, aqui começa a parecer uma espécie de prisão criativa. É como se a estética, que deveria ser uma linguagem a serviço da história, se tornasse o próprio protagonista, deixando a trama, os personagens e até o próprio público em segundo plano.

A sensação, conforme o filme avança, é de estar assistindo a uma vitrine de manequins meticulosamente organizados. Tudo é impecável, bonito, perfeitamente simétrico, e, paradoxalmente, frio. O roteiro, que parte de uma premissa até interessante envolvendo uma conspiração diplomática e o tráfico de um artefato fenício, rapidamente se dissolve em diálogos excessivamente elaborados, onde cada frase parece mais preocupada em soar inteligente e espirituosa do que, de fato, transmitir emoção, gerar conexão ou mover a narrativa com naturalidade.

O humor, que deveria brotar organicamente das situações absurdas e das idiossincrasias dos personagens, surge aqui travado, artificial, como se cada piada estivesse previamente plastificada. As situações se encadeiam com tanta rigidez que qualquer possibilidade de surpresa ou espontaneidade desaparece. É um filme que parece estar mais interessado em ser observado como um objeto de design do que em ser vivido como uma experiência emocional ou narrativa.

Divulgação | Universal Pictures

Os personagens, que em outros momentos da filmografia do diretor ganharam vida mesmo dentro de suas excentricidades, aqui são peças de um tabuleiro estético. Eles não respiram, não sangram, não transbordam nada além da função que ocupam no jogo visual. São arquétipos ambulantes; o burocrata neurótico, a noviça blasé, o espião infiltrado. Todos coreografados para caberem perfeitamente nos enquadramentos, nas paletas e nos eixos de simetria, mesmo que isso custe qualquer traço de humanidade.

O maior sintoma desse desequilíbrio está no ritmo. Mesmo sendo um filme relativamente curto, ele parece se arrastar. Há uma estranha percepção de lentidão, não porque falte conteúdo, mas porque o excesso de formalismo esgota a atenção. É aquele tipo de obra que você observa com fascínio nos primeiros minutos, admirando cada detalhe, cada composição, cada escolha estética… até que, em algum ponto, você percebe que está lutando contra o sono, desejando que algo, qualquer coisa, rompa aquela superfície impecável e permita que alguma fagulha de vida atravesse a tela.

No fim das contas, O Esquema Fenício é um filme que sintetiza uma espécie de crise criativa dentro do próprio cinema de autor. Quando a assinatura estética se torna mais importante do que a própria obra, o filme deixa de ser uma experiência sensível e se transforma em um exercício de estilo, belíssimo, sim, mas também vazio, hermético e cansativo. É uma celebração do excesso de controle, onde tudo é tão perfeito que se torna, paradoxalmente, insuportavelmente artificial.

É um filme que você respeita, que você admira como quem observa um relógio suíço desmontado sobre a mesa, maravilhado com a precisão de cada engrenagem. Mas, passada essa admiração inicial, resta apenas a constatação incômoda; toda essa beleza, sozinha, não é suficiente para segurar o peso de uma história que se perdeu no caminho.

O filme estreia nos cinemas em 29 de maio.

Avaliação - 5/10

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