Crítica | Olhos de Wakanda - É uma minissérie de quatro episódios que oscila entre momentos inventivos e um constante sabor de “poderia ter sido mais”.
Divulgação | Marvel Animation |
• Por Alisson Santos
A Marvel Animation está buscando se aventurar em diferentes estilos e formatos, explorando histórias paralelas ao UCM com liberdade estética e narrativa. Olhos de Wakanda, disponível no Disney+, parte de uma ideia instigante; mostrar uma rede de espiões que, ao longo de séculos, protege segredos e artefatos de Wakanda contra o mundo exterior. No papel, é uma mistura sedutora de espionagem histórica, ação e ficção científica. Na prática, é uma minissérie de quatro episódios que oscila entre momentos inventivos e um constante sabor de “poderia ter sido mais”.
A série abre em Creta, 1260 a.C., numa ambientação que mescla tons multiculturais — sotaques variados, figurinos diversos e a sensação de uma cidade cosmopolita para a época — com o peso de uma ameaça iminente. O antagonista Nkati, autoproclamado “O Leão”, comanda frotas piratas e um sistema de dominação que mistura violência física com propaganda ideológica. A protagonista Noni, uma ex-agente expulsa, é recrutada para deter essa força. É um ponto de partida que sugere intriga, infiltração e suspense, mas o tempo reduzido de cada capítulo não permite que a tensão se acumule.
Esse é o primeiro e talvez maior problema de Olhos de Wakanda; cada episódio se encerra quase no mesmo instante em que começa a ganhar corpo. A estrutura episódica lembra Predador: Assassino de Assassinos — que também mistura elementos históricos com ação —, mas lá havia uma cadência mais envolvente, tempo maior para explorar personagens e um trabalho visual que elevava a narrativa. Aqui, os roteiros de Geoffrey Thorne apostam em histórias diretas, lineares e pouco desafiadoras, com resoluções rápidas demais para o potencial das premissas apresentadas.
Visualmente, Olhos de Wakanda é um caso curioso. Os cenários são, sem exagero, lindíssimos; lembram pinturas, com texturas que evocam quadros clássicos. Paletas quentes, planos amplos e atenção ao detalhe tornam cada ambiente uma pequena obra de arte. Mas então, sobre esses fundos elaborados, entram os modelos 3D dos personagens — e o contraste é gritante.
As figuras humanas, com proporções exageradas inspiradas em Ernie Barnes, têm um aspecto mais voltado para o artificial. Falta-lhes imperfeições naturais; não há linhas de expressão, rugas, marcas de pele — elementos que ajudariam a torná-los mais orgânicos. Isso cria uma sensação de deslocamento, como se figuras digitais recém-geradas fossem inseridas sobre telas pintadas à mão. Nas cenas de ação, essa estética funciona; nas dramáticas, afasta o espectador, dificultando a conexão emocional.
Divulgação | Marvel Animation |
Ainda assim, há pontos em que a série encontra seu ritmo. O segundo episódio, “Lendas e Mentiras”, é o mais memorável. Ambientado na Guerra de Troia, ele brinca com figuras da mitologia grega como Aquiles, inserindo-o de forma inteligente no contexto do universo Marvel. A mistura de combate, mitologia e espionagem cria um capítulo mais coeso e instigante — justamente por se permitir experimentar além da fórmula básica dos outros episódios.
Os capítulos seguintes visitam a China do século XV e a Etiópia de 1896, explorando culturas diversas e conectando missões aparentemente isoladas num arco maior. Porém, a ligação entre elas só se revela mais claramente no episódio final, quando a ficção científica ganha espaço e um elo com os filmes live-action do UCM é sugerido. Essa conexão tardia reforça a sensação de que a série tinha potencial para uma temporada mais longa, onde as relações e intrigas poderiam ser mais bem trabalhadas.
Outro aspecto que merece nota é o tratamento da violência e dos temas políticos. Olhos de Wakanda não é voltado para crianças menores de 14 anos; há sangue, escravidão, manipulação ideológica e conflitos morais que tornam os Cães de Guerra personagens de moral ambígua. Essa abordagem é corajosa, mas, paradoxalmente, acaba diluída pela pressa da execução. Questões que poderiam gerar dilemas complexos se resolvem em minutos, enfraquecendo o peso das escolhas feitas pelos personagens.
No saldo final, Olhos de Wakanda é uma obra que seduz pela ideia e decepciona pela execução. Há lampejos de criatividade — especialmente no segundo episódio —, mas eles surgem em meio a um conjunto que nunca se permite amadurecer. O visual 3D, competente mas pouco encantador, não compensa a narrativa simplista e o ritmo apressado. Para fãs de Wakanda e completistas do UCM, é um complemento curioso. Para quem busca uma animação de impacto, com densidade narrativa e força visual, há opções mais sólidas.
A minissérie já está disponível no Disney+.
Avaliação - 6/10
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