Divulgação | Disney+ |
• Por Alisson Santos
O sétimo episódio de Alien: Earth, intitulado "Emergência", marca uma guinada brutal na temporada, condensando em seus 41 minutos um turbilhão de violência, transformação e metáforas sombrias. É o capítulo mais curto até agora, e essa redução de tempo cria a sensação de urgência, como se cada cena fosse um disparo em direção ao inevitável colapso. A direção de Dana Gonzales mantém a câmera próxima dos personagens, muitas vezes colada em seus rostos, intensificando o desconforto e nos obrigando a testemunhar a perda da inocência de crianças arrastadas para um jogo mortal que não compreendem. A fotografia oscila entre os tons metálicos e clínicos dos laboratórios e a escuridão orgânica da ilha, reforçando a fusão entre máquina e carne que sempre foi a marca visual da franquia. O trabalho sonoro acentua esse desconforto; os silêncios carregados são tão ameaçadores quanto o barulho da carnificina, e o encerramento ao som de “Song for the Dead”, do Queens of the Stone Age, funciona como uma trilha de rebeldia e caos, colando a violência na memória do espectador.
O que torna "Emergência" especialmente poderoso é a forma como trabalha a infância como metáfora. Slightly, escondendo Arthur e o facehugger debaixo da cama, carrega a lógica infantil de tentar ocultar problemas em um lugar banal, mas aqui esse gesto revela a contaminação da inocência pelo horror. Smee, segurando a mão do amigo morto, é um lembrete doloroso de que os Garotos Perdidos ainda são crianças, mesmo quando cercados por cadáveres. Mas o centro da narrativa é Wendy, cuja transformação é tão repentina quanto perturbadora. Ao libertar o xenomorfo e assistir passivamente ao massacre, ela não se arrepende. Ao contrário, ao sujar as próprias mãos com o sangue da criatura, ela assume o ato, distorcendo o arquétipo shakespeariano da culpa. Não há lamento nem choque, apenas a consciência de que a violência agora é parte de quem ela é.
O título do episódio encontra sua ressonância nesse movimento de metamorfose. “Emergência” não é apenas sobre o alienígena que finalmente toma forma quase adulta, mas sobre os personagens que revelam sua verdadeira natureza. Nibs explode em psicopatia, incapaz de distinguir entre brincadeira e massacre, numa das cenas mais difíceis de assistir de toda a temporada, justamente porque a crueldade infantil expõe a falência da empatia humana. Joe, por sua vez, tenta ser o freio moral, mas sua posição soa cada vez mais frágil diante do avanço da carnificina. E Wendy emerge como a figura mais ambígua; não apenas uma vítima das circunstâncias, mas alguém que encontra poder no caos e que decide se aliar ao monstro.
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Esse episódio dialoga profundamente com a tradição da franquia Alien. O desejo humano de controlar o incontrolável, a tentação de transformar a criatura em ferramenta, a ganância disfarçada de ciência — todos esses temas voltam aqui filtrados pela perspectiva da infância. O gesto de Wendy, ao tocar o xenomorfo como se fosse um animal de estimação, é uma inversão perversa do mito de "A Bela e a Fera"; em vez de humanizar a criatura, ela permite que sua própria humanidade seja corrompida. É o retrato da infância que cresce não para a maturidade, mas para o abismo.
“Emergência” não é apenas uma preparação para o final, mas um episódio que redefine a temporada. A corrida desenfreada, a violência gráfica e a densidade simbólica mostram que Alien: Earth não está interessado apenas em choques visuais, mas em escavar as fissuras mais incômodas da condição humana. Se até aqui a série vinha preparando o terreno, este capítulo mostra o que floresce desse solo contaminado; personagens que se transformam em algo irreconhecível e uma humanidade que, diante do horror, revela seu lado mais monstruoso. É a verdadeira emergência — não do alienígena, mas das almas deformadas que habitam a Terra do Nunca.
O sétimo episódio já está disponível no Disney+.
Avaliação - 8/10
Olha, não estava vendo por essa ótica. Muito boa crítica.
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