Divulgação | HBO Max |
• Por Alisson Santos
Por mais contraditório que pareça, Pacificador sempre foi uma série sobre a guerra interior de um homem que diz lutar pela paz — custe o que custar — mas que mal consegue manter a própria alma em pé. E "Chave Nelson", o episódio final da segunda temporada, dirigido e escrito por James Gunn, reforça exatamente isso; o equilíbrio improvável entre redenção e ruína, entre amor e autossabotagem.
Ao longo de seus 58 minutos, o capítulo tenta amarrar uma temporada que, embora cheia de momentos brilhantes e humor corrosivo, também se mostrou irregular e inchada. Gunn aposta na emoção entre Chris Smith (John Cena) e Emilia Harcourt (Jennifer Holland) como eixo central da despedida, e é justamente aí que o episódio encontra sua força. O reencontro dos dois, repleto de nostalgia e vulnerabilidade, é um lembrete de que Pacificador nunca foi apenas sobre supervilões ou universos paralelos, mas sobre o desejo desesperado de ser perdoado — e amado.
A tão mencionada “noite no barco” finalmente é revelada, e, para surpresa de muitos, não é o episódio de paixão impulsiva que os fãs imaginavam, mas um momento singelo, marcado por um beijo contido, uma troca de olhares e uma breve conexão entre duas pessoas quebradas. É James Gunn em sua essência; subverter o clichê para encontrar humanidade onde se esperava vulgaridade. Cena e Holland têm uma química madura e trágica; há algo doloroso em vê-los tentando acreditar que podem ser melhores juntos, mesmo quando tudo ao redor desmorona.
Chris, que passou a temporada mergulhado em culpa, encontra em Harcourt uma espécie de redenção silenciosa — e a maneira como o episódio constrói isso é genuinamente comovente. O diálogo final entre eles, quando Harcourt admite que a noite “significou tudo”, ecoa como um pedido de perdão coletivo por tudo que a série fez seu protagonista suportar.
Mas o resto do episódio não tem a mesma sorte. O arco de Rick Flag Sr. (Frank Grillo) é um dos pontos mais problemáticos do encerramento. Sua transformação de agente moralmente ambíguo em vilão quase caricatural soa apressada, sem o peso dramático necessário. Grillo faz o possível para dar dignidade ao personagem, mas o roteiro o deixa preso entre motivações vagas e uma trama que parece mais interessada em preparar terreno para o futuro do DCU do que em concluir o que construiu até aqui.
Divulgação | HBO Max |
O mesmo vale para Adebayo (Danielle Brooks) e sua esposa Keeya, cuja relação, importante no início da temporada, é resolvida de maneira apressada, como se restassem apenas minutos no relógio para fechar pontas soltas. Vigilante (Freddie Stroma) e Economos (Steve Agee), por sua vez, ficam reduzidos a alívios cômicos ocasionais — o que, embora divertido, empobrece a dinâmica de grupo que fez a primeira temporada funcionar tão bem.
Gunn tenta equilibrar emoção e fan service ao preparar o terreno para o que virá; o nascimento da Xeque-Mate, uma nova organização secreta liderada pela equipe do Pacificador e outros agentes, e a prisão de Chris em Salvação, um realidade extradimensional que promete ser o grande cenário da próxima temporada. O problema é que essas ideias, embora intrigantes, são apresentadas mais como teasers do DCU do que como desfechos orgânicos.
A sensação é de que "Chave Nelson" quer ser, simultaneamente, um epílogo e um prólogo — mas acaba tropeçando no meio do caminho. Ainda assim, há momentos que resgatam a essência da série; a presença simbólica de Eagly, o humor de Vigilante sendo cruel com a própria mãe, e a trilha sonora cuidadosamente escolhida — com Nelson e Foxy Shazam pontuando os momentos de maior introspecção — lembram que Gunn continua dominando a arte de misturar sarcasmo e sensibilidade como poucos.
Apesar dos tropeços, o episódio encerra a temporada com uma nota emocional inesperadamente sincera. A cena em que Adebayo grita para Chris que acredita em milagres "porque viu uma águia abraçar um homem" poderia soar absurda, mas, no universo de Pacificador, é um lembrete tocante de que mesmo as figuras mais desajustadas merecem uma chance de salvação. O problema é que, enquanto o vínculo entre Chris e Harcourt entrega emoção verdadeira, o restante do enredo parece se perder em intenções. O resultado é um episódio com alma, mas sem estrutura — belo e frustrante em partes iguais.
"Chave Nelson" é um final melancólico e imperfeito, que reflete o próprio protagonista; contraditório, cômico, trágico e, acima de tudo, humano. James Gunn encerra a segunda temporada de Pacificador com mais sentimento do que coesão, mais promessas do que conclusões. Ainda assim, é impossível não se deixar tocar pela jornada de Chris Smith — um homem que, ao tentar "tornar o mundo melhor", descobre que o primeiro passo é aprender a amar quem ele vê no espelho.
O último episódio já está disponível na HBO Max.
Avaliação final - 7/10
A quebra de expectativa gigantesca que o James Gunn fez com esse episódio 😂
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