Crítica | Zootopia 2 - Mais do que um filme divertido, é um lembrete de que histórias sobre convivência, memória, desigualdade e pertencimento podem — e devem — ser contadas de forma acessível, leve e vibrante.
| Divulgação | Walt Disney Animation Studios |
• Por Alisson Santos
Zootopia 2 chega com a difícil missão de revisitar um universo que, em 2016, surpreendeu por unir humor, aventura e uma crítica social inesperadamente madura. E se há algo que a nova animação deixa claro desde seus primeiros minutos — quando Judy Hopps e Nick Wilde recebem, diante de aplausos protocolares, um reconhecimento institucional que mais soa como tentativa de “passar pano” para velhos preconceitos — é que a sequência não quer apenas repetir a fórmula. Ela quer provocar. Quer incomodar. Quer divertir. E, no processo, quer dizer alguma coisa.
Num cenário em que várias animações recentes da Disney se refugiam em nostalgia ou inofensividade calculada, Zootopia 2 é a rara continuação que mira temas espinhosos com um sorriso no rosto. A cidade continua colorida, frenética, cheia de detalhes que só fazem sentido quando o espectador olha com cuidado. Mas, por trás da superfície brilhante, a narrativa bate na tecla; os conflitos do primeiro filme não desapareceram, e a sociedade segue lidando com cicatrizes que não se curam com discursos bonitos.
Judy Hopps continua movida por seu idealismo inquieto. É dedicada, compulsiva, teimosa e mais determinada do que nunca a provar que merece seu lugar. Nick Wilde, por outro lado, equilibra seu charme preguiçoso com uma preocupação cada vez mais evidente pela parceira — uma camada emocional que aprofunda os dois personagens e traz uma sensibilidade nova à relação deles. A dinâmica entre os dois está no cerne da narrativa, mas agora acompanhada de um novo desafio; provar que são mais do que uma “dupla exótica” dentro da corporação. O filme brinca com esse incômodo com inteligência. O Departamento de Polícia não sabe lidar com a ideia de que um coelho e uma raposa possam, de fato, operar como unidade funcional em meio a duplas de mesma espécie — e isso é explorado tanto para humor quanto para comentários sociais.
O caso envolvendo a víbora Gary é onde o filme realmente encontra sua alma. Carismático, gentil e incapaz de entrar em cena sem perguntar “permissão para abraçar?”, Gary é uma figura que destabiliza a lógica da cidade. Seu pedido para “ajudar sua família a voltar para casa” abre espaço para uma investigação que expõe camadas incômodas sobre a fundação de Zootopia — e, por consequência, sobre as decisões que sustentam seu status quo. Por meio dele, Zootopia 2 toca em temas como expulsão de povos, apagamento histórico e desigualdade institucional. Não é uma abordagem pesada, mas também não é infantilizada. É equilibrada o suficiente para atingir diferentes faixas etárias sem perder potência.
Os Lynxley, no topo da pirâmide social da cidade, são uma das grandes forças cômicas do filme. Inspirados (e escancaradamente parodiados) em "Succession", Milton Lynxley e seus filhos são uma crítica feroz à elite arrogante que molda as regras e depois finge neutralidade. A dinâmica entre Cattrick e Kitty, sempre divididos entre bajulação, competição e vício no próprio reflexo digital, cria momentos que dialogam diretamente com pais e crianças — cada grupo entendendo a piada à sua maneira. E Pawbert, o caçula atrapalhado, é uma daquelas figuras que transitam com fluidez entre a sátira e a simpatia involuntária. O novo prefeito — um cavalo bombado cuja inteligência parece ter sido substituída por músculos — arranca risadas genuínas, ainda que sua presença seja mais cômica do que necessária.
| Divulgação | Walt Disney Animation Studios |
Se há um departamento em que Zootopia 2 supera o original, é o visual. A variedade de ambientes, espécies e microdetalhes é tão grande que o filme parece pedir para ser visto mais de uma vez. A rave no deserto, o Mercado do Pântano, são alguns dos momentos mais ousados esteticamente da Disney em anos; explosões de luz e cor, criaturas de todas as texturas e formatos — tudo imerso em uma nova música contagiante de Gazelle.
Outros detalhes mostram o cuidado técnico; a percepção térmica de Gary, os bairros anfíbios, o sistema de rodovias aquáticas, e até pequenas piadas visuais escondidas no canto da tela. O filme se move num ritmo tão acelerado que às vezes chega perto de atropelar suas próprias ideias, mas essa velocidade faz parte de seu DNA; Zootopia 2 quer ser consumida com os olhos, os ouvidos e o riso.
Se o filme acerta no humor, nas referências e no visual, sua fluidez narrativa é menos sólida. Há momentos em que a história avança rápido demais, conectando pistas e conflitos sem dar ao espectador o tempo de absorver o impacto emocional. O conflito central, embora relevante, não se integra à história pessoal de Judy e Nick com a mesma naturalidade vista no original. O resultado é um filme que brilha por suas partes, mas nem sempre pelo conjunto. Ainda assim, essa irregularidade não compromete a experiência — apenas destaca o quanto o primeiro filme era redondo.
Zootopia 2 não é apenas uma continuação. É uma releitura do que fez Zootopia funcionar e uma ampliação de sua ambição. Tem humor afiado, visual indulgente, crítica social bem embalada e personagens que continuam evoluindo. Não atinge a coesão impecável do original, mas compensa com energia, criatividade e coragem — três qualidades raras nas grandes animações do estúdio nos últimos anos.
Mais do que um filme divertido, é um lembrete de que histórias sobre convivência, memória, desigualdade e pertencimento podem — e devem — ser contadas de forma acessível, leve e vibrante. E se, no meio disso tudo, você ainda sair do cinema com uma serpente fofa pedindo “um abracinho?”, aí é só um bônus.
Zootopia 2 estreia amanhã nos cinemas.
Avaliação - 8/10
Ok, me convenceu.
ResponderExcluirVey eu quero mt ver esse filme mds
ResponderExcluirEles vão virar casal?
ResponderExcluirAmei 😍
ResponderExcluirVou levar meu filhote para ver, ele ama o primeiro filme.
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